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“SOMOS TODOS OS MESMOS” e “Pisar em ovos” Bug Sociedade


Emily Kame Kngwarreye (1910-1996)

“SOMOS TODOS OS MESMOS” Bug Sociedade

Para o Trump, Biden é velho, decrépito, incapaz. Como será que ele vai tentar desconstruir – ou destruir – Kamala Harris? Mulher, incompetente e sem coragem de expulsar os mexicanos? Bem, de algum modo tudo o que acontece com os latinos nos atinge diretamente, já que só mesmo no Brasil pode-se acreditar que existem brasileiros brancos...

A nossa falta de discernimento sobre a mistura racial no Brasil é mesmo impressionante. Pega um “clarinho” e ele acha, acredita que não vai ser visto como latino, tratado como latino – embora seja latino. Mil vezes, no Sul, pessoas dizem que são europeias, tendo nascido aqui mesmo, apenas porque seus antepassados vieram para o Brasil fugidos da guerra.

-  O Trump será implacável com os latinos, mas nós somos seus amigos!!!! Somos latinos diferentes! Somos? Alguém avisou o Trump que o muro, a dificuldade em tirar vistos permanentes “não vale pra brasileiro porque nós somos amigos”?

O que é brasileiro conservador? Aquele que não gosta que sua filha mostre as pernas, de saia curta? Que proíbe que ela sambe nas festas? Aquele que quer que ela reze, ao invés de namorar? Que permaneça virgem? Aquela que tem que beber escondido do pai ou, sendo menino, precisa mostrar que é “homem” pra agradar em casa?

Infelizmente, Kamala não tem o “relax charmoso” do Barack, nem a autonomia emocional de Michelle. Mas tem uma energia que sabemos que existe porque todo promotor a tem. E com isso, o Trump ainda não conta. Ótimo momento para debates.

Se os debates fossem aqui? Meu Deus! Em primeiro lugar, os políticos iam nos encher de proibições: Não pode perguntar isso, nem aquilo. Não pode deixar de saia justa. Não pode investigar. Em nome disso, o Brasil já elegeu Collor, que rapinou o dinheiro de todo mundo e foi o responsável por inúmeros suicídios. A TV dizia que ele era bonito, parecia cheiroso, charmoso. Bem, rima com isso: Collor foi PAVOROSO, DESASTROSO.

Ainda não podemos falar de Bolsonaro sem ter medo de um processo, mas isso também vai passar, como Collor de Melo passou – alcaguetado pelo próprio irmão.

Como nossos pais, vimos o “caçador de marajás” ser substituído pelo “caçador de corruptos” – e agora vemos que o caçador pode ir preso pelos mesmos motivos que apontava nos outros. E o Trump? É democrático você destruir o mundo porque conservador “ama” petróleo, mesmo sabendo que o petróleo vai matar o mundo? Conservador então é não perceber as mudanças do mundo? É não ligar se seu neto morrer sufocado, derretido, afogado num planeta que cada vez é menos amigável? É ser antivacina, anti Terra redonda e ser feliz, mesmo que todos estejam doentes?

Eu conheci uma garota que dizia no meio de uma discussão: “Você pensa isso porque é feia”! – e isso – o ser feia – parecia pior do que o motivo da desentendimento. Mas era? Porque Trump, o antidemocrático, vai debater o mundo com Kamala, a mulher ou Kamala a negra ou Kamala a vice que foi incapaz de expulsar muitos latinos. Os outros latinos, claro. Nós não. O Trump é “nosso amigo”... Brasileiro nem é muito latino, afinal...

E como nossos pais acreditaram que os comunistas “comiam criancinhas”, os conservadores acreditam que o Brasil vai virar Cuba – embora ninguém saiba o que virar Cuba quer dizer. É porque é comunista ou porque a educação é prioridade? É porque é pobre ou é porque, apesar de pobre, o sistema de saúde é super avançado? O que é, afinal, o Brasil virar Cuba, se acontecem coisas boas e ruins por lá?

Como nossos pais diziam, ainda somos os mesmos e vivemos, acreditamos em histórias plantadas, não perguntamos, não duvidamos.

E enquanto isso os políticos fazem lifting facial e continuam os mesmos – afinal, nos enganar é tão simples...

Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV

 

“Pisar em ovos” Bug Sociedade

Assistimos ao jogo de basquetebol, de preparação para a Olimpíada, entre a Alemanha e os EUA e vemos Lebron James jogando muito. Faz 40 anos em dezembro. O desempenho de Cristiano Ronaldo no Europeu de Futebol, fez muitas pessoas apontarem uma diminuição da capacidade para se manter ao mais alto nível. Faz 40 anos em fevereiro de 2025. No esporte a exposição é muita e a avaliação é muito visível. Marcava golos e agora não marca. Fazia muitos pontos, rebotes, e agora não. Corria mais do que os outros e agora chega em segundo. Fazia manobras incríveis e agora nem consegue surfar uma onda comum. Temos muito exemplos e qualquer pessoa, independentemente da área profissional, consegue perceber com alguma facilidade a mudança. Basta olhar. E cada atleta, decide as suas circunstâncias – quando termina, ou quando diminui o ritmo. Alguns, como o futebolista alemão, Toni Kroos, decidem sair quando estão no topo do mundo. Outros querem ficar, ficar, ficar e não se importam dessa descida de rendimento. Aceitam tranquilamente. Vejam Rafael Nadal, o que já atingiu, como era intransponível e como aceita generosamente as derrotas atuais, porque ele acima de tudo quer continuar a jogar. No entanto, continua a ser um terrível oponente e a vitória do português Nuno Borges, na final do torneio da Suécia, em Bastad, foi sensacional.

Ficar ou ir, prejudica outro alguém? Prejudica a economia do mundo? A saúde das outras pessoas? Prejudica nosso ego talvez, porque já não vamos mais poder assistir aos desempenhos incríveis desse atleta que se aposentou.

Mas como deve ser a hora de sair de cena, na vida empresarial, financeira, ambiental, da saúde e política? Vai ser necessário que a avaliação exterior - os outros, as críticas, os opositores – pressionem o fim? Vão ser necessárias várias mortes em cirurgias para aposentar um cirurgião? Várias pontes e edifícios caírem para aposentar um engenheiro, um arquiteto, um mestre de obras, um pedreiro, um carpinteiro, um ferreiro?

Têm de ser os outros? Ou devemos ser nós? Nós que devemos ter a nobreza para nos retirarmos, antes de começarmos a fazer “besteiras”? Somos o ser vivo mais inteligente ou apenas dizemos que somos? Os gatos quando percebem que vão morrer, vão para um lugar escondido e longe de seres vivos e deitam-se aguardando a sua morte. Eu vi isso acontecer e é impressionante. A nobreza da ação é espantosa e tocante. Deixa um ser humano com vergonha de não ser capaz de fazer o mesmo.

Como seres humanos aprendemos que abandonar não é uma ação edificante e por isso, resistimos nos lugares, obrigamos os outros a suportarem a nossa presença e as diminuídas capacidades e enganos alarmantes. Como se nisso estivesse algum ato heroico. Ficar atrapalhando, ficar desorganizando, ficar sendo um fardo, como isso pode ser edificante? E qual é o problema de ficar incapaz? Não faz parte da vida? Achamos que vai acontecer algum milagre, dirigido à nossa pessoa, e vamos morrer sem dor, nem perda de capacidades? Só os outros ficam incapazes? Nós, vamos ser sempre um espetáculo de perfeição? E seremos sempre os maiores e os mais talentosos? E quantos erros, enganos, asneiras, estragos, são permitidos, até que as luzes vermelhas da sociedade, das redes sociais e dos amigos e patrões, comecem a tinir e a gritar? Olha que muitos de nós não têm nem uma hipótese de erro. Nem meia. E outros falham, falham e falham e ninguém abre a boca para apontar, denunciar, alertar. Mas isso já todos sabemos e aceitamos. Tem os que podem fazer o que quiserem e os que é bom não pisarem riscos nem limites. Mas uma das maiores potências do mundo fazer de conta que nada está acontecendo – e o nada acontecendo, já acontece há muito – dá um exemplo terrível ao mundo. E uma sensação de desnorte, de abandono.

A partir de agora acho que vou obrigar a minha médica a responder a algumas perguntas do programa “Quem quer ser milionário?”, antes de aceitar o seu diagnóstico e medicamentos para tomar. E ao cirurgião, uns exercícios de coordenação motora e cognitiva em simultâneo, antes de me deitar na mesa de operações. E ao piloto de aviões comerciais? E ao policial? E ao motorista de Uber? E só me aposento quando ficar cega, surda, muda e coxa. Venha quem vier...

Ana Santos, professora, jornalista

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