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“FALANDO ABERTAMENTE SOBRE O ABORTO” Bug Sociedade


Todo mundo tem uma opinião sobre praticar ou não praticar o aborto, aqui e no resto do mundo. O problema é que a questão principal nunca foi e nunca será de opinião, mas sim de Estado. Apenas recordando, cabe ao Estado proteger todos os seus cidadãos, independentemente de suas crenças, religiões ou motivos.


Os homens falam de aborto como se a mulher grávida acordasse e, por falta de programa, resolvesse abortar. Aí criminalizam, tornam pecado, condenam e proíbem o tema, a discussão. Mas não me lembro de nenhuma discussão onde fosse colocada a questão do ponto de vista da mulher abandonada ou seviciada, violentada, violada, espancada pelo marido que lhe chuta a barriga, miserável, sem casa, sem comida, sem possibilidade, morando na rua, que se descubra grávida e sem a menor condição de ter e manter um bebê. Ter? Não ter? É uma decisão sempre e impreterivelmente solitária e muito difícil pra qualquer mulher. E seja qual for a decisão – vai haver sofrimento. Além disso, o Estado vai tentar colocar um pé fora da sua vida porque ninguém quer investir em atendimento de qualidade para todos. Falo de nós - esse País tão machista, tão horrendamente machista, que acha normal gastar milhões em próteses penianas e nada em absorventes para mulheres pobres.


Homens – calem-se, por favor. O silêncio ignorante de vocês já nos faz barulho suficiente – sim, porque a ignorância faz um enorme ruído. Portanto, nenhuma mulher aborta porque está entediada ou amaldiçoada ou seja o que for. Ela aborta porque, naquele momento, não vê outra saída pra sua vida, pra vida da criança ou ambos. E não costuma esquecer nunca o que fez e os motivos; não costuma esquecer a culpa. As mulheres não são seres irracionais e irrelevantes que precisam de “seres superiores masculinos” que consigam pensar por elas – precisam de leis que as protejam e lhes deem poder e autonomia para decidirem se podem ou não podem arcar com o resultado de um estupro sem terem que ir passar vergonha na delegacia, depois no IML, depois na vizinhança, nos jornais e na boca do povo porque a dor de não poder ter um filho naquele momento já é suficiente.


O homem poderia pensar que os filhos não se fazem sozinhos, por exemplo e pensarem bastante antes do sexo casual, usarem camisinha, falarem sobre evitar filhos antes de transar. Por quê esse assunto também não faz parte da formação dos meninos? Quando um homem abandona uma mulher por estar grávida, ele não está abortando aquele filho também, à sua maneira? Ah, mas desse aborto não se fala, é aceitável – é até viril, se bobear.


Então, de novo. Homens – calem-se, por favor.


Nessa sociedade masculina, há pouco o que nós conseguimos respeitar, muito menos digerir. Uma fome, uma miséria, pobres por todos os lados e de dentro de suas Mercedes e Porsches, se tem a ousadia de opinar sobre cuidados de saúde para um povo que é sumariamente abandonado... Calem-se, calem-se...


Enquanto as mulheres morrem de todos os jeitos – e os piores jeitos – a sociedade masculina e patriarcal continua dando privilégios, trocando favores escusos e esfregando na nossa cara conceitos inadmissíveis sobre o que é segurança pra nós e eles, saúde, educação, casa, transporte, qualidade de vida. E se a filhinha do “papai Mercedes” engravida e não pode ter o filho naquele momento, ela vai pra Europa onde, deprimida, aborta lá - enquanto milhares de mulheres tão deprimidas quanto as ricas são abandonadas e morrem por falta de cuidados médicos aqui mesmo, debaixo de seus olhos “que abominam os pecados do mundo”.


É tão vergonhoso ver essa discussão, que...


Senhores homens. Ao autorizar o aborto, não vai ter fila de mulheres pra fazê-lo. Não somos malucas. Não somos surtadas. Não somos levianas. Para cada ser humano que tem direito a opinião, basta decidir por si e para si mesmo se poderia fazer o aborto ou não. Mas o Estado? O Estado tem o dever de cuidar da saúde dessas mulheres. Se Deus vai acolhê-las é problema delas com Ele e não vejo ninguém aqui com capacidade e bondade e generosidade para adivinhar o que Ele faria. Não numa sociedade onde muito poucos ganham uma enormidade de dinheiro e desviam mais, conchavam mais, enquanto todos estão se esgueirando pelas latas de lixo. Portanto, cada decisão deve ser única e pessoal e já será sofrida o suficiente assim.


Em um discurso de Barack Obama, há talvez a melhor relação de pensamento sobre isso: Abraão, séculos atrás, mataria Jacob para obedecer ao Anjo do Senhor. Porém, se o Anjo aparecesse agora e nos pedisse isso, nenhum pai, em sã consciência, mataria seu filho - e se o fizesse, nós pegaríamos o celular e ligaríamos 190 na hora. Porque as sociedades evoluem. Porque as pessoas evoluem.


Homens – calem-se logo de uma vez. Por favor, nem mais um pio. Porque até esse silêncio hipócrita nos ofende.

Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV


“FALANDO ABERTAMENTE SOBRE O ABORTO” Bug Sociedade

Somos uma pessoa em nós, somos uma pessoa com os mais “chegados”, somos uma pessoa para fora, para a sociedade, para a opinião pública. Escondemos nossas misérias apontando os defeitos dos outros. Sobre assuntos que nunca viveremos na pele, no útero, temos teorias, censuras, decisões fáceis, ligeiras, superficiais, atoladas de argumentos. Sentimos que somos o Maverick do Top Gun. Realmente o filme é muito bem produzido, cheio de virilidade e de decisões de “homem”. E somos assim, viris, vencedores, fortões. Até a vida nos bater à porta para “verificar” se somos mesmo assim. E aí, era tão bom que finalmente baixássemos a guarda e nos mostrássemos como somos – humanos. Mesmo assim ainda empurramos para a frente, negamos, justificamos, culpamos outros, para ver se a vida se vai embora e nos deixa de novo no quarto dos brinquedos a fazermos de conta que somos gente.


Durante a vida teremos muitas vezes de nos enfrentar, de repensar opiniões, decisões, pontos de vista por que quando menos esperamos chega uma pandemia, uma incapacidade, um problema financeiro. Falar dos outros é muito fácil. Demasiado fácil. Mais fácil quando não fazemos nada, porque quando estamos ocupados a viver e a tentar fazer algo de útil, costumamos ser mais cautelosos e mais ponderados nas opiniões.


Tive um namorado que sei que ficou muito chateado quando veio me visitar num final de semana habitual e eu “fugi” dele. Ficou muito calado, ofendido acho. Não era de muitas palavras e não foi capaz de me perguntar o que se passava e eu não tive coragem de lhe dizer a razão de tudo isso. É fácil dizer que devia ou podia ter feito de outra forma mas fiz desta e, dadas as circunstâncias, foi a melhor decisão. Talvez isso tenha sido o início dele começar a “deixar” a nossa relação, acho eu agora à distância. Não fizemos amor nesse final de semana e eu não consegui ter a coragem de lhe dizer que tinha esquecido de tomar a pílula e a médica achou melhor ficar uns dias “determinados sem arriscar”. Não disse, não quis arriscar, nem quis que a decisão fosse dos dois pela simples razão que se engravidasse o problema passaria a ser meu. E eu nunca quis que uma gravidez fosse um problema. Soube de demasiadas situações desumanas. Outras desconfortáveis. Outras destruidoras. Inacreditáveis.


Crianças, adolescentes e adultos vivos que estão vivos porque as mães os quiseram e lutaram por isso, porque se fosse da vontade dos pais, tinham abortado. Alguns até marcaram e levaram as mulheres aos consultórios, tentando resolver “o problema”. E as mulheres recusaram, sempre, batendo com a porta. E hoje são pais babados quando alguém elogia seus filhos. Outros, enquanto namorados, e de comum acordo com sua mãe (leu bem), exigem o aborto por não ser a melhor altura para a sua carreira, vida, sei lá eu. E, espantem-se, continuam a namorar, casam, têm vários filhos e tudo certo. Parecem filmes de terror né? Mas são a vida, bem do lado. E isto é só uma amostra.


Falar e opinar sobre o aborto, todos somos exemplares. Na hora da verdade é que se vê...ou deixa de se ver porque desaparecemos como fumo...


Existe uma tendência para se imaginar que a mulher que decide fazer um aborto é alguém que não respeita a vida humana, que só se quer divertir, que não é religiosa, nem de boas famílias. Que não presta. Que é egoísta. Etc. Etc. Etc. Ui, ui, ui. Desejemos sempre que as circunstâncias da vida nos permitam nunca ter de avançar para territórios difíceis, duros e aterradores.


Eu sempre aconselho o filme “Vera Drake” ou “O Segredo de Vera Drake” para as pessoas pararem de falar na teoria e se preocuparem com a realidade.


Existem muitos outros pontos de vista mas vou deixar um que é capaz de ser bom que pensemos nele sempre que temos muitas certezas: “No lugar daquela pessoa o que eu faria? Não como conversa teórica, não! Na real! O que eu faria, com o dinheiro que tenho, com os amigos e família que tenho, no lugar onde vivo e a pessoa que eu quero ser?” Não esqueça...é na real, porque no faz de conta tudo termina sempre bem e todos são felizes para sempre.

Ana Santos, professora, jornalista

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