Num momento onde galgamos a possibilidade de termos o mundo dentro do bolso, com o smartfone e a internet, nos deparamos com cada vez maiores incapacidades de comunicação. Isso nos leva a uma separação: informação é totalmente diferente de comunicação e no início da nossa aventura, acreditávamos que fossem conhecimentos complementares.
Estamos saturados de informação – nem sabemos mais, com 100% de certeza, quais são as informações verdadeiras e aquelas que são feitas para nos apartar da verdade. Um assassino serial precisa de 38 tiros para morrer ou cada soldado precisou dar seu tirinho pra se sentir o Rambo da hora? Por quê as pessoas precisam se sentir no comando do sofrimento dos outros? E o principal: As pessoas não se perguntam acerca de suas crueldades? Sabem quando estão sendo cruéis e o fazem por vontade ou é tudo meio sem querer?
Pelo celular, nós recebemos partidas e contrapartidas pró ou contra os governos, mas o fato indiscutível é que morreram centenas de milhares no Brasil e devem morrer mais algumas centenas de milhares, até a pandemia acabar. Isso não é maldade, nem mentira, nem injustiça. Apenas é.
Você vê ou sabe uma coisa e decide, seja por pressão, vergonha ou decisão não a contar. Quem descobre e aponta isso não é mentiroso, nem injusto ou cruel. É apenas quem aponta. Mas, em defesa desse algo impreciso que é a percepção da justiça ou injustiça, aparecem culpas e culpados, julgamentos e castigos.
Assim, de detalhe em detalhe, quando você procura pela verdade, pela comunicação do fato, acaba sendo arremessado para a desinformação da informação, para a verdade percebida e não a factual. Isso é o mundo. Temos ferramentas poderosas de comunicação, mas também temos medo de comunicar nossas fraquezas através dela. Para esconde-las, apontamos, criamos e guarnecemos nossas imaginações com as fraquezas que interpretamos que as outras pessoas têm porque afinal, devem ter.
Por aquilo que deve ser terrível - embora não saibamos, não tenhamos nenhuma informação concreta - destruímos caminhos retos de comunicação. E um caminho reto não precisa ser florido – precisa ser seguro, embora apontando sol e chuva no horizonte. Porque errar é totalmente humano. Mas não admitir que errou, vendo o erro na sua frente e o justificando, fugindo dele e acusando, metralhando, matando com 38 tiros, é coronelista e facebookiano.
Uma desculpa sincera, ainda faz bastante falta como ferramenta de aproximação.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Tanto a dizer...mas será que me vão entender? Será que vou conseguir comunicar o que desejo comunicar? Que o que vou comunicar tem interesse? É útil?
Talvez seja onde os povos são mais diferentes, a comunicação. As palavras até podem ser as mesmas, mas o significado, a importância, o momento em que são ditas, é totalmente diferente. Totalmente. E faz toda a diferença. Visitar os países em turismo, em viagem de negócios, para estudar, não são momentos complicados. Chegam a ser até engraçados, curiosos e ficam para a história de vida das pessoas. Memórias inesquecíveis para contar aos netos. Mas, se vai viver para outro país, prepare-se, porque na maior parte das vezes, os problemas de comunicação não serão engraçados. Serão muito complicados. Serão despesas. Serão problemas. Serão dores. Serão mágoas. Serão desilusões. Mudarão a sua visão dos lugares, das pessoas. Uma enorme pena. Médicos num país sendo pedreiros noutro, médicas num país sendo empregadas de limpeza noutro. Eu me pergunto até quando vamos deixar a burocracia nos engolir, nos esmagar. Até sermos nós os que somos esmagados? A burocracia transmite uma comunicação dura, injusta, degradante, excludente. A burocracia de uns choca com a burocracia de outros. Resultado? O ser humano fica com máquinas burocráticas para resolver. Uma máquina em cada país. Uma completa loucura.
Os hábitos de comunicação também são outro enorme problema. Vícios de linguagem que mantêm preconceitos, desigualdades. injustiças. Comentários que se aprendem para se fazer parte de um grupo e que são horrorosamente venenosos e degradantes. Que viram normais, adequados e são elogiados. Os grupos de WhatsApp são talvez o melhor exemplo disso. Cards (foto com frase) deixados ao acaso, reencaminhados, que são autênticas bombas. Pessoas com cargos e profissões de muita responsabilidade que perpetuam comentários que eu nem vou colocar aqui para não estimular a continuidade. É tempo de acordarmos, de percebermos que não dói só quando é conosco ou com os que amamos e protegemos.
E a cereja no topo do bolo – as Fake News. Que aumentam, evoluem, disseminam, desenvolvem. Criam uma poluição na comunicação tão grande que chega a ser quase como caminhar durante uma tempestade no deserto, sem cobrir a cara. Não conseguimos limpar a comunicação, construir um espaço saudável de convivência e reina a desconfiança entre todos e tudo. Mundo, mundo. Para onde está caminhando?
Ana Santos, professora, jornalista
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