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2 Contos de Imbrocháveis


Fotografia retirada do site "Juntos no Candomblé"

Conto “ATENÇÃO, HOMEM IMBROCHÁVEL”

As mulheres tentavam, mas era difícil “engolir” a vontade de rir daquilo tudo. Lá estavam eles, os homens: se sentiam a última bolacha do pacote, mas não conseguiam sequer aguentar a própria vontade de fazer xixi. Eram muros, postes, árvores – tudo poderia virar alvo dos “xixis implacáveis”. Se sentiam como se segurar o xixi não fosse o objetivo das mães de crianças de pouco mais de 1 ano - como se fazer xixi nos muros fosse muito diferente de fazer xixi na fralda ou no canto da sala...

Maduros, incríveis, “imbrocháveis”, caíam a cada dor de cabeça mais forte. Saíam das “quatro linhas” das regras e leis se dizendo corajosos, mas com os olhos femininos mais fixamente ligados, eram apenas pessoas que se sentiam protegidas por outras. Quando a proteção acabava, trocavam facilmente “canalhas” por “injustiça”...

- Pobres “imorríveis”, esses caras... porque também é preciso alguma serenidade e entrega de espírito, algum desapego de erros e acertos para aceitar que vai morrer, assim como todo mundo... Que vai perder e que vai pagar, se abusar. Que vai ver a banda passar e continuar “sentadinho, de castiguinho”... até aprender a dividir e a obedecer as regras da casa.

Homens assim, são “incomíveis” – quem quer comer seres “impensantes”, afinal? De grossura em grossura, de indelicadeza em indelicadeza, lá vão eles – os imbrocháveis – a caminho dos desfiladeiros do esquecimento.

Lá estarão os gritos e sussurros, os urros de dor e impropérios, mas – segurando o sorriso que aflorava, teimoso – o gênero feminino, com o olhar pousado apenas naquelas tentativas de produzir ataques desnecessários e patéticos, se divertia em silêncio, como quase sempre. Afinal, pra quê o escândalo, se o escracho e a sutileza do olhar desviado, davam a ironia necessária ao silêncio?

- Me segure, senão eu pego! Me estabilize, me acalme, senão eu mordo! (eheheheheh)

Pobres homens do tipo imbrochável... vocês são mesmo incomíveis – por todos... São incorrigíveis, inelegíveis, meros “fazedores de xixi, por aí”, incapazes de verem a poesia de um banheiro lavado, o esforço de uma cozinha sem farofa por todos os lados, incapazes de arrumarem uma cama, de serem independentes, autônomos e capazes de sobreviverem por si mesmos.

Lá estão os incomíveis, sempre no mesmo lugar – reclamando e ameaçando. Mas nunca limpando, fazendo, contribuindo, assumindo... bem aí entra o espaço do xixi na calça, no muro, na árvore; vem a falta de educação básica, o vaso sanitário pingado, a reclamação, mas nenhuma ação.

Ela pediu o divórcio friamente. Ele ficou lá xingando e cuspindo, como era seu costume e ela, mentalmente, enquanto dava o número de sua advogada – do gênero feminino, claro – gargalhava mentalmente: i-ne-le-gí-vel! I-ne-le-gí-vel! Nada de manutenção de casamento! Era mesmo o fim! Pegue as malas e saia.

E num esgar irônico, sem palavras, pensou:

- Espere pelos outros processos. Na hora de definir a pensão alimentícia, você vai se lembrar das cenas que protagonizou, pode acreditar.

E foi ajudá-lo a arrumar a mala. Pela última vez. Ele, sendo “o imbrochável”, não sabia...

Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV


Conto “Eu? Estupro? Que injustiça...”

É incrível como a vida é injusta. É incrível como as pessoas são mal agradecidas.

Eu dediquei a minha vida a jogar futebol, uma vida de sacrifícios, de esforço, de treinos, estágios, viagens, horários, regras. Fiz tudo isso para que meu País tivesse os melhores resultados mundiais e em vez das pessoas me agradecerem, ainda me acusam. Um homem como eu que desde menino só pensa em jogar futebol pelos clubes e pelo País, não merece esta tamanha injustiça.

É verdade que ganhei dinheiro, casas, carros, fama, mas também me esforcei por isso. Se queriam o que eu tenho, deveriam ter se esforçado como eu. Não se esforçaram como eu e agora querem o que eu tenho? Nã, nã...

Tenho muita gente para cuidar: empregados, amigos, família, advogados, cabeleireiro, manicure, cozinheiro, empresário, motorista, jardineiro, etc. Muita gente que ajudo, que dou apoio, que não seriam nada sem mim. Claro que me devem lealdade. Nada de mais. Vivem do meu dinheiro, ué! E tem sempre mais um ou uma por perto para ajudar.

Tenho mulher, tenho filhos. Os filhos têm escolas caras e a mulher tem de ter tudo de bom: roupas, viagens, compras, divertimento, para ficar bem e me deixar sossegado. Se ela estiver bem, eu posso ter uma vida mais sossegada e posso ter liberdade para os meus “bagulhos”.

E agora me digam. Depois de tudo isso que vos contei, ainda querem que eu seja santo? Qual é o mal de enganar a minha mulher? De sair com os amigos para “comer” outras mulheres, enquanto minha mulher está em casa de luto pela morte da mãe? Acham que devia ficar em casa? A fazer o quê? Não é uma boa oportunidade para a deixar sossegada em casa e eu ir me divertir? Assim ficamos os dois satisfeitos. É só ter cuidado em escolher a discoteca – nada de câmeras de vídeo nos lugares onde vamos estar com essas mulheres. Ir com amigos de confiança ou com gente que depende do meu dinheiro – ficarão de boca calada para não perder a “fonte de rendimento”. Levar uma droguinha “do amor” para colocar na bebida das “menina” e “é doce”. Fazer o que der vontade mas ter o cuidado de não “deixar provas de DNA”. Ter um celular secreto para agendar estas meninas, para a minha mulher e minha família não descobrirem. Também dá se alugarmos um sítio, ou apartamento, mas tem de ser feito com mais cuidado. É que nas discotecas que já sou conhecido, está tudo controlado, aqui no Brasil “é doce” qualquer coisa que eu queira fazer em segredo. O problema é enquanto estou em países europeus e cheios de regras. Mas tudo se faz. Já tenho muita experiência. E tenho aprendido com outros jogadores amigos, outras ideias, outras formas de nos divertirmos sem problema. “É doce”.

Daqui a dois anos termino o contrato neste clube europeu e quero ir para um clube da Arábia Saudita. Vou ganhar muito mais, com isso ganho poder para “calar bocas”, para poder continuar a fazer meus bagulhos sem ninguém me chatear ou punir. Talvez ser acionista nos principais jornais esportivos, de um ou dois canais de televisão e a partir daí fica tudo muito mais “doce”. E tem mais que eu posso fazer, mas já chega para não abrir muito o jogo.

Qual é o problema de transar com outras mulheres? E transar com elas bêbadas? Ou drogadas na bebida? Elas já sabem para o que vão. Ter a sorte de transar com um cara famoso como eu já é uma grande oportunidade, uma sorte. Ainda se queixam depois? E me acusar de estupro. Quem? Eu? Estupro? Que injustiça... Eu sou um homem bom...

Ana Santos, professora, jornalista

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