Lindo o Teatro Rubi. A fórmula me lembra muito o teatro Rival, no Rio de Janeiro, embora eu esteja anos sem lá voltar. Mas o Rubi tem uma classe e uma opulência que o Rival não tinha, com certeza.
Estreia, frisson e a majestade de Eliana Pedroso que trouxe emoções de sobra, amor de sobra. Uma mulher forte que, ao homenagear Paulo Gaudenzi demonstra o tamanho da relação entre ambos com aquele leve tremor na voz, nas mãos e aquele olhar para o céu, em oferecimento. Foi o primeiro grande momento, com certeza.
Abrem-se as cortinas para 3 grandes atrizes. Tinha tantas saudades de Evelin e da voz tão bem pontuada que ela mostra, tenho tanto carinho pelo trabalho de Luísa e pelo talento enorme que ela sempre mostra ao menor gesto e tenho tanta admiração pela voz e pela expressividade de Cristiane que só vou dizer isso delas. Sempre guardo saudades de pessoas especiais.
A leveza do espetáculo me causou emoções antagônicas que perduram. As mulheres são leves ou os homens ainda nos veem assim? Então como explicar a complexidade de gestos e na voz de Eliana? É... temos a sombra de dor ao nosso redor. Somos perpassadas pela dor, pelas perdas e pela capacidade de nos solidarizarmos com as pessoas e suas perdas. Não somos factuais como os homens, mas processuais. Não falamos muito. Pensamos de outra forma. Por isso, se o adolescente mata colegas de escola, sofremos pelas mães, pela perda inestimável de vidas, pela violência do mundo. É como um relâmpago que faz parte da estrutura feminina e que nos dá o peso do drama, como ação contínua.
A cena da avó apontou o peso que carregamos continuamente. E Cristiane foi excepcional. A cena onde as atrizes apontam os estupros também mostrou o relâmpago ali. E na Argentina, uma mulher matou o marido torturador com 185 facadas; a filha do casal a ajudou e os argentinos não veem o caso como homicídio, mas como legítima defesa. É a dor, que complexa, se esconde numa sombra atrás dos olhos de cada mulher. Disso eu senti falta. Mais falta ainda porque as atrizes são pessoas excepcionais, mulheres excepcionais.
As músicas são maravilhosas. Adoro musicais onde elas complementam o conteúdo. As vozes, maravilhosas, precisam de um pouco de atenção no trabalho de respiração e pelo que percebi um pouco de trabalho aeróbico também. As meninas cansam. Fora isso, a menção da plateia que, ao confundir espetáculo com show, aplaudia a cada final de canção. Será que a cidade está com tanta falta de musicais assim?
Ana Ribeiro, diretora de teatro, cinema e TV
Seja bem vindo ao glamour baiano, à produção luxuosa, ao profissionalismo. Tudo impecável. Tudo certo. Organização, gentileza, glamour, charme, beleza, talento. Sincronização perfeita de luzes, sons, músicas, canções, momentos, mudanças, charme, beleza e competência das atrizes. Cantam, dançam, muito expressivas. Talentosas.
Sou estrangeira. Por causa disso, acho que este espetáculo funciona maravilhosamente para turistas. Bem sacado e bem construído. Estando o Teatro Rubi dentro de um hotel, fica perfeito. Fácil acesso, fora do Teatro você está dentro e seguro. Confortável.
A produção foi muito generosa em convidar o Bug Latino para a estreia e eu e Ana ficamos muito honradas e gratas. Nossas críticas a eventos culturais são divulgadas principalmente pelo Brasil, por Portugal e por todos os países de língua portuguesa.
Enquanto o público aguarda pelo momento do espetáculo, talvez a música ambiente pudesse ser um pouco mais melódica. Parece-me que o fato de ser uma música com alterações melódicas muito amplas provoca muita agitação nas pessoas. A musicoterapia ajuda na escolha das músicas mais adequadas para situações variadas. Numa organização tão perfeita é um detalhe que pode ajudar ou prejudicar.
Tendo assistido a algumas peças de teatro na cidade: na rua, em teatros de baixo orçamento, comunidades, etc, senti uma diferença estonteante ao entrar no Teatro Rubi. O público, o lugar, a organização, o cardápio, a energia. Tudo é tão diferente. Tudo é tão distante dos outros “Salvadores”. Chocante. Salvador tão glamoroso, Salvador tão difícil.
Em Portugal este tipo de espetáculo é chamado de “Teatro de Revista”, por ter humor e ser musical e passar em Casinos/Cassinos, enquanto as pessoas jantam. Também pode ser chamado de musical e pode ser apresentado em Teatros ou Casinos/Cassinos. É na verdade um espetáculo de entretenimento. Teatro Rubi tem esse formato. As pessoas pedem bebida e comida durante o espetáculo. Mais uma vez, escolha super adequada ao local.
Eu aprendi que quando as pessoas são mais talentosas, inteligentes, instruídas, poderosas, educadas, têm maiores responsabilidades perante os outros. Aprendi que devem multiplicar, colaborar, ajudar, aproveitar a sua “vantagem” para ajudar os outros, fazer alguma diferença na vida das pessoas que não tiveram tantas oportunidades como eles. Porque esse poder, deve ser usado a favor da sociedade, a favor da resolução de problemas sociais. O mundo está cada vez mais estranho, perigoso e contraditório. Precisa de ajuda e contribuição de pessoas ponderadas, justas, informadas. Por tudo isto que falo, fiquei pessoalmente um pouco desapontada com o texto do espetáculo. Em pessoas tão talentosas e poderosas na cultura da cidade e do país, aguardava maior profundidade no texto, maior contribuição com questões tão complexas e difíceis para as mulheres no mundo. Sei que existiam intenções de humor, sátira. Opções válidas. Mas envelhecimento, TPM, menopausa, homossexualidade, traição, ser mãe, mãe solteira, não ser mãe, ser pai e outros, são temas que precisam de ser trabalhados com sensibilidade e que precisam da ajuda de todos. Principalmente dos que têm mais poder social, mais informação, mais visibilidade. Spike Lee poderia não fazer mais filmes. O último filme dele é sensacional. Mais do que os anteriores porque aprendeu a usar o seu poder, visibilidade e inteligência a favor dos que não podem nem tiveram as oportunidades que ele teve.
Quem sou para dizer o que devem fazer? Não sou ninguém. Mas sei que podem ajudar a fazer a diferença. Através da linguagem, da comunicação, do vosso talento.
Ana Santos, professora, jornalista.