Incômodo. Essa é a sensação principal do espectador de Ruína dos Anjos. Aquele cara na cadeira de rodas segurando a distinta plateia em pé, no meio da calçada do Politeama... E ficar naquele lugar cheio de mendigos estranhos e suspeitos, ter que levantar nossos olhos e encarar, fixar nosso olhar naquele bando sujo de pessoas indesejáveis, marginais, mal educadas!... SENSACIONAL! Termos que caminhar por lugares por onde nunca se caminha porque somos regidos pelo medo e fugimos da nossa própria humanidade para não ver, não interagir, não olhar... não, não, não... somos filhos da nossa negação, em fuga pela cidade, cegos, surdos e mudos para os invisíveis que em Salvador se multiplicam, pedindo dinheiro, atenção, conversa, cachaça, qualquer coisa que se assemelhe a vida e convivência e caos na escrita pq no Brasil tudo começa com caos ,falta de planejamento, roubalheira, esperteza na desigualdade social da qual fugimos aterrorizados dia após dia... Isso já seria motivo suficiente pra tirar todo mundo das cadeiras novinhas dos teatros novinhos e tomar a rua, que é o nosso lugar. Se não for, vão perder. Há a voz que fiquei com medo de acabar de repente, dada a quantidade de gritos? Há. Há o exagero de alguns atores que poderiam dosar o que funcionaria melhor, embora a miséria seja over? Há. Há o caos que faz parte do texto que muitas vezes faz parecer que o jogo fica cansativo? Há. Mas, quando a peça une, no escuro, todos nós, o cara incômodo da cadeira de rodas olha nos nossos olhos e dentro deles há o brilho da vida que qualquer um de nós reconhece no outro. O brilho da nossa humanidade perdida no facebook, nos linchamentos virtuais e reais, na vida que nos escapa... e aquele aleijado idiota, toca a nossa alma com um carinho que a gente não vê. .. Parabéns a todos.
Ana Ribeiro - Voz e Direção de Teatro
Se você vive sem caminhar na rua, sem saber que pessoas o rodeiam para além das que lhe dão conforto, sem ter noção do lixo que todos fazemos, do perigo que existe latente pela noite, dos ônibus que correm como tiros nas noites vazias, do que existe e pulsa fora do seu carro passando na cidade, veja esta peça. Se tem coragem e vontade de ver o mundo e a vida com todas as cores, veja a peça. Precisamos de ver, de saber, de participar, colaborar, entender...mudar. Veja como atores apaixonados e talentosos te mostram uma fatia do que pode ser a vida e a noite; do que pode ser a vida de pessoas mais sensíveis e frágeis; do que pode ser a vida se você não tem quem te proteja, te entenda, te aceite; a vida dos invisíveis. Peça incómoda, pela demora em iniciar, porque te coloca na rua, porque te mostra como tudo muda de repente, porque te cansas da peça como se já fosse suficiente, porque os verdadeiros personagens da rua vêm assistir, pedir dinheiro, porque a miséria está mais próxima e porque no fim te emociona muito num momento de recato e carinho recordando como todos somos sensíveis e humanos.
Agradeço a cortesia pelos dois bilhetes e pelo momento difícil e verdadeiro.
Ana Santos - Corpo
Nossa! Forte ! Mexe nas entranhas do preconceito nosso de cada dia! O tema Como diz no banquete de Platão : “ .....é tão belo quanto maldito”
Difícil mas extremamente atual é necessário.
Bravo!👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼