A forma como estamos nos encapsulando para viver está estampada em ¾ do filme e é devastadora. Não estamos apenas sozinhos e solitários – estamos abandonados e entregues ao poder, seja ele qual for. Agora, com a pandemia, tudo ficou mais claro e visível, mas já estávamos assim. No filme UM INVERNO EM NOVA YORK, vemos a doença do encapsulamento amealhando vidas e as adoecendo, minando – e nada lentamente. A gente fica meio frágil e se sentindo à descoberto, já que alguém determinou que cada vez menos pessoas podem ter um refresco, uma sombra pra descansar este, que é cada vez um maior e enorme esforço – viver e sobreviver.
E lá está alguém regido pelo medo - como nós - que decide fugir e se restabelecer – como alguns de nós. Mude o cenário e nos verá a todos. Temos uma casa que deveria ser um refúgio, mas nem sempre é assim. Ou nem sempre a economia, a doença, a miséria, a violência, nos permite continuar sob aquele teto.
A quem recorrer? Pagamos tantos impostos, taxas, temos tantas discussões, debates, workshops, políticas, leis e normas – você sabe a quem recorrer? Há um lugar que a ONU, a Cruz Vermelha, os Congressos Nacionais, os Governos Federais deixem ali, pra todos, com esse fim? Claro que não.
E você vê pessoas que precisam de apenas um empurrão, ficarem tropeçando na nossa frente. Talvez, antes, a sociedade tivesse um jeito melhor de se aproximar e oferecer ajuda. Atualmente a sua mãe pode morrer que muita gente “esquece” de dizer “sinto muito”, apenas. E ainda se ofendem quando a gente cobra! Nem isso. Pelo menos isso.
O filme conta exatamente essa história que se repete em mil cenários – nossos cenários. A beleza é que, de alguma forma, as pessoas, no filme, dão um passo atrás e se veem, se percebem. De um jeito tímido, pouco esfuziante, mas um passinho depois do outro. Ali, elas, ao estenderem a mão para coisas simples, se fortalecem umas às outras – como a vida poderia ser, deveria ser – e enfrentam e resolvem grandes problemas apenas porque alguém conhece alguém, que pode ajudar alguém.
Um grande filme. Não tem cenários bonitos, não tem atores bem vestidos – e você vai somar muitos “não tem”: não tem glamour nenhum, não tem figurino chique, não tem comida que dê água na boca – mas tem gente em seu melhor papel – o de gente, o de empatia, o de generosidade. E nisso, o diretor e os atores se superaram!
Talvez seja um bom filme pra iniciar uma conversa em casa sobre o significado de ajudar, de contribuir – mamãe e seus filhos adolescentes que não veem nada além de si mesmos, papai e sua ausência de ajuda doméstica, famílias que justificam faltas e omissões de socorro, de olhos, de ouvidos, nós e a nossa relação com o lixeiro, o pegador de latinhas. Nós e a nossa relação com os outros. Nós e a nossa generosidade depositada em algum lugar distante de nós.
Imperdível.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Um filme que peço que veja. Por favor, veja. Que este filme possa, eventualmente e em todos nós, recuperar velhos hábitos e aprendizagens de bondade, gentileza, partilha. Velhas práticas conhecidas de todos mas cada vez mais esquecidas. Utilizamos até as mesmas palavras para fazer coisas bem diferentes, com objetivos diferentes. Se prepare para ser tocado, para perceber que vale sempre a pena tentar encontrar o lugar “melhor” para cada um neste mundo tão difícil, tão duro, tão inesperado. Que vale a pena lutar pelo que se acha certo e saudável. Apesar de todas as consequências. Sempre existirá alguém ou “alguéns” que estendem uma mão, umas vezes pequena, umas vezes maior. Mas é sempre uma mão, é sempre uma salvação. Todos um dia poderemos precisar. A vida dá realmente muitas voltas.
Filme poético e livre de preconceitos de qualquer tipo. Ajudar, curar, dar um lar, dar comida a quem tem fome, ser gentil, apenas. Apenas...Tudo...
Atores incríveis, escolhidos a dedo.
Abordagem com humor, mas também com doçura, candura, sensibilidade, de temas importantes a enfrentar nas sociedades: violência familiar, indigência familiar, indigência social, maus tratos, voluntariado, etc. Nos ensina muita coisa. Ou, nos recorda muito do que deixamos de fazer. Ou, nos anima, confirmando que estamos no caminho melhor.
Curioso que pelo trailer não veria o filme. Foi uma sorte perceber que o filme é tão especial. Por isso afirmo mais uma vez. Tente ver. Sim, tem questões de roteiro, questões de vários âmbitos a discutir, se você só quiser olhar para o filme, enquanto filme. Mas se quiser ver e sentir o que filme tenta dizer....você sangra, você chora, você sente, você confirma como a vida é tão terrível e dura e, tão sensacional e mágica. E que cada um de nós escolhe em larga medida o que aceita sofrer para poder viver, sentir, apreciar a magia de estar vivo. E que cada um é tão belo e tão mágico, nas suas diferentes formas de ser. E que não somos o que temos nem o que fazemos. Somos o que somos e todos merecemos ser tratados com dignidade, gentileza e respeito.
Um filme sobre pessoas. Emocionante. Impactante. Um filme que mexe com nosso coração. Mais uma vez, veja, veja, veja...
Ana Santos, professora, jornalista
Informações
Diretor: Lone Scherfig
Elenco: Zoe Kazan, Esben Smed, Jack Fulton
Sinopse: A história de pessoas cujas vidas se entrelaçam durante um inverno dramático na cidade de Nova York.