Da nossa delícia de assistir filmes teoricamente feitos para o público infantil, vem o fato indiscutível de que ENCANTO é uma animação adulta, que trata de questões presentes da vida atual, numa linguagem pulsante, musical e emocionante.
Depois de King Lion, chorar no cinema vendo desenho animado virou um lugar comum, pra mim. Em ENCANTO, você se apaixona pelo traço das personagens, o desenvolvimento das personalidades, as vozes, as músicas, a ambientação inteira, que nos leva a incríveis fantasias mas, ao mesmo tempo, nos sustenta com traços emocionais muito bem definidos.
O nível de mistura das cores é impressionante, a construção vocal/dramática das personagens no carrega pra grandes questões humanas e do meio para o final do filme você começa se perguntar por que perdemos a capacidade de fazemos coisas de que gostamos, pelo prazer de as fazer e caímos em todas as armadilhas de pressão, de competitividade, de ter que conseguir mais, mais, mais – o que nos retira do eixo de felicidade para nos colocar sob a pressão de ser sempre melhores. Em tudo.
Em Salvador da Bahia, bem longe da fábula colombiana de ENCANTO, meus alunos têm enormes dificuldades em dizer “não sei”. De alguma forma, se perde a ideia de que o não sei é a chave do sei (já que alguém pode explicar), para “não vou bancar o burro aqui”. Como o fato de sermos ignorantes em uma coisa nos torna, ao invés de curiosos aprendizes, em burros? Qual o prazer de aprender qualquer coisa se nos sentimos inferiorizados por não sabermos tudo? Mas quem sabe tudo?
Como redescobrir o prazer de viver, encarando e vencendo a pressão da busca da perfeição é o princípio ao redor da animação. E vale demais à pena desenrolar o fio filosófico ao redor da história, gente... Nós vemos o mal que a sociedade vem criando em torno de uma coisa que parece que está deixando de ser instintiva – a busca do prazer de fazer, a busca de respostas para nossas questões intrínsecas. A nossa busca.
A beleza do desenho vai ganhar as crianças e talvez seja importante nos despirmos dessa “capa meio besta de sabe-tudo” para depois tentarmos explicar pra elas porque e o quê nos faz ter coragem de abrir mão de uma coisa tão preciosa quanto a alegria de fazer o que gostamos. Será por isso que tantos advogados, médicos, engenheiros, arquitetos, funcionários públicos, bancários escrevem livros, fazem filmes, pintam, atuam?
Assistam, chorem e, sobretudo, peçam bons conselhos às crianças – nós as estamos estragando.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro, TV
Encanto - um filme que realmente é um encanto! Com um roteiro que nos confronta com as famílias e o hábito de rotularmos cada elemento, com sua função/talento/dom. No meio dessa categorização, sempre tem os que são menos valorizados, quase considerados estorvo ou desnecessários. Erros de aprendizagem, de hábito, de descuido, que marcam muito e que podem fazer muita diferença no futuro dessas pessoas, claro, mas também no futuro e bem estar das famílias.
Aqueles que parecem os aborrecidos, mau feitio, teimosos, que sempre apontam e alertam para a realidade, são incómodos demais quando as famílias querem manter as aparências. Talvez até para se enganarem a si próprias, mais do que aos outros. Como se fossem melhores ou até perfeitos não pelo que são mas pela família que mostram. A foto do Facebook ou Instagram com frases tipo “sempre juntos”, deve ser para se convencerem que são melhores do que todas as outras famílias. Engraçado, não sabia que recebíamos um prêmio ou um óscar por sermos melhor família do que as outras. Pois esta família que sofreu no início, construiu-se repleta de magia, felicidade e alegria. Tapava os defeitos até que não foi mais possível fazê-lo. E chegou a hora de se olharem verdadeiramente e perceberem que afinal, ainda são melhores quando se aceitam e se mostram nas qualidades e defeitos. Será que existem famílias assim no mundo? Talvez todas...
A riqueza da cultura da Colômbia estampada nas cores, nas casas, nas pessoas, nos relacionamentos, na magia, na energia, nas músicas. Uma delícia!
Um filme doce, muito fofo, com músicas incríveis, do gênio Lin-Manuel Miranda.
Mais um filme de animação para crianças, mas totalmente para adultos. Amei, amei, amei. Tente não perder.
Ana Santos, professora, jornalista
Sinopse: Na Colômbia, uma jovem lida com a frustração de ser o único membro da família que não tem poderes mágicos.
Diretor: Jared Bush, Byron Howard, Charise Castro Smith.
Narração: Stephanie Beatriz, María Cecilia Botero, John Leguizamo.
Trailer e informações: