Não sei bem se as pessoas aqui sabem quem é esta jornalista, escritora e dramaturga americana, mas se não conhecem, é hora de ir ao Google e colocar o nome dela porque seu trabalho é de uma honestidade pouco vista. O mundo que tantas vezes é incompreensível como agora, lá está. E Joan está lá, manejando com extrema delicadeza os socos que nos dá na boca do estômago. Mas dá sempre. Com força e delicadeza.
Um documentário falando dela e com ela, é alguma coisa de imperdível. Suas histórias, seu casamento, como aconteceu sua filha, seu trabalho, sustos, intercorrências e o motivo de sua obra mais importante (pelo menos pra mim, que até já adaptei o texto, o enxuguei e este pequeno compêndio numa peça, aqui mesmo, em Salvador) – “O ano do Pensamento Mágico”. Que livro! Que documentário! Assim como ela, o filme não tem muitas meias palavras – ela está extremamente magra, anoréxica mesmo e é o que ela vive, no momento – amigos que tentam fazê-la se alimentar. Suas perdas foram enormes e eu até gostaria que ela não tivesse relatos tão importantes, se fosse pra que sua vida a poupasse um pouco mais.
Imagens lindas e homenagens não se comparam ao que conseguimos vislumbrar do que ela sente. E claro – escreve. Nos Estados Unidos e na Europa, este livro do Pensamento Mágico foi adaptado para o teatro com enorme sucesso, sob forma de monólogo – já com um enxerto de mais uma perda que acontece como tudo na nossa vida – em um segundo.
Vale ver pela biografia que é sensacional, moderna e incrível, pela capacidade de transformar uma vida real – a dela – em dramaturgia, em história – o que nos permite aprender com sua dor, sentir a sua dor e vale pela época incrível em que ela e o marido atuaram no jornalismo americano, retratando o melhor fervilhar da nossa rebeldia, que se traduzia em histórias sensacionais.
Vendo o mundo cada vez mais fechado em conchas particulares, em guetos de direitos, o filme com a biografia de Joan Didion é praticamente um fato obrigatório na vida de quem regula com a idade dela, os mais novos, como eu e os muito mais novos, como a geração de jornalistas que sai da escola todos os anos, sonhando em ter um emprego sólido. Mas um emprego sólido costuma ficar com a nossa autonomia e ela e o marido foram à luta em busca das melhores histórias.
No caso dela, certamente isso se traduziu num enorme êxito, podem acreditar.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Uma escritora gigante, um monstro da literatura...com 1,52 m de altura. Uma das escritoras que mais amo ler. Uma mulher que é capaz de usar a palavra de forma espantosamente honesta e assertiva, nos momentos mais difíceis da vida. Sua coragem sempre me espantou. Admiro profundamente sua capacidade de usar a palavra para enfrentar e digerir o que não entendemos, o que sofremos, o inesperado. Teve uma vida invejável, conviveu e foi amiga dos grandes nomes do cinema, música e literatura americanos dos anos 60. O carpinteiro que renovou algumas partes de sua casa em Malibu, a casa de Sergio Mendes, foi Harrison Ford.
Teve sempre uma capacidade de análise e de descrever a vida, única e excepcional. Manteve essa capacidade após o marido morrer, escrevendo “O ano do pensamento mágico” e após a filha adotiva morrer, escrevendo “Noites azuis”. Duas obras difíceis mas obrigatórias. Escreveu uma peça de teatro “O ano do pensamento mágico” onde mistura os dois livros criando uma das obras mais dolorosas e importantes do século XX.
Se nunca ouviu falar nesta escritora nem nas suas obras, veja o documentário e pense em ler uma das suas obras – “O ano do pensamento mágico” em primeiro lugar. Se já conhece esta força da natureza literária, veja também o documentário. Ele aborda muitas questões da sua vida que são muito interessantes e nos dá ainda maior dimensão do seu talento.
Um documentário realizado através de “crowdfounding” e dirigido pelo sobrinho. Uma fofura dedicada à tia, que bem merece. Uma ternura em vida.
Ana Santos, professora, jornalista
Informações sobre o documentário
https://www.netflix.com/br/title/80117454
https://www.imdb.com/title/tt7253506/
Diretor: Griffin Dunne
Sinopse: A icônica cronista americana Joan Didion reflete sobre sua prolífica carreira e batalhas pessoais neste documentário dirigido por seu sobrinho, Griffin Dunne